B U R E A U   O F   P U B L I C   S E C R E T S


 

A Alegria da Revolu��o

Cap�tulo 3: Momentos decisivos
 

Causa dos abismos sociais
Convuls�es de p�s-guerra
Efervesc�ncia de situa��es radicais
Autoorganiza��o popular
FSM
Os situacionistas em maio de 1968
O obrerismo est� obsoleto, mas a posi��o dos trabalhadores segue sendo central
Greves selvagens e ocupa��es
Greves de consumo
O que poderia ter sucedido em maio de 1968
M�todos de confus�o e coopta��o
O terrorismo refor�a o estado
O momento decisivo
Internacionalismo



Cap�tulo 3: Momentos decisivos

�Quando o v�u m�tico � rasgado a trama � revelada, as rela��es de explora��o e a viol�ncia que as mant�m s�o desnudadas, e a luta contra a aliena��o � definida com clareza, a� surge a ruptura, revelada repentinamente como uma luta corpo a corpo contra o rei nu, exposto em sua for�a bruta e debilidade. . . . momento sublime em que a complexidade do mundo se torna tang�vel, transparente, ao alcance de todos�.  

�Raoul Vaneigem, �Banalit�s de base�


Causas dos abismos sociais

� dif�cil generalizar sobre as causas imediatas dos abismos sociais. Sempre houve uma grande quantidade de boas raz�es para a revolta, e antes ou depois surgiram instabilidades no sentido de que algo deve mudar. Mas por qu� em um determinado momento e n�o em outro? As revoltas ocorrem com freq��ncia tanto em per�odos de progresso, como debaixo das piores condi��es. Enquanto algumas s�o provocadas pelo mais completo desespero, outras o s�o por incidentes relativamente triviais. Os agravos aceitos pacientemente durante tanto tempo porque pareciam inevit�veis podem repentinamente parecer intoler�veis diante da possibilidade de sua sua elimina��o. A mesquindade de alguma medida repressiva ou estupidez de qualquer patochada burocr�tica podem por em evidencia o absurdo do sistema mais claramente que uma acumula��o constante de opress�es.

O poder do sistema se baseia na cren�a das pessoas em sua impot�ncia para opor-se a ele. Normalmente esta cren�a est� bem fundada (os que transgridem as normas s�o castigados). Mas quando por uma raz�o ou outra bastante gente come�a a ignorar as regras e o fazem com impunidade, a ilus�o colapsa por completo. O que se pensava que era natural e inevit�vel se v� como arbitr�rio e absurdo. �Se ningu�m obedece, ningu�m manda.�

O problema � como alcan�ar esse ponto. Se s� desobedecem uns poucos, estes podem ser facilmente isolados e reprimidos. De nada adianta fantasiar sobre as coisas maravilhosas que poderiam ocorrer �se todo mundo concordasse em fazer tal ou qual coisa.� Desgra�adamente os movimentos sociais n�o costumam funcionar desta maneira. Una pessoa com uma pistola de seis balas pode manter a distancia a centenas de pessoas desarmadas porque cada uma delas sabe que os primeiros seis a atacar ser�o assassinados.

Contudo, alguns podem estar furiosos a ponto de atacar sem fazer caso do risco; ou tentar convencer aos que est�o no poder de que � mais prudente ceder pacificamente do que resistir despertando um �dio ainda maior contra si mesmos. Obviamente � prefer�vel n�o depender de atos de desespero, mas buscar formas de luta que minimizem o risco at� que o movimento se estenda o suficiente para que a repress�o j� n�o seja fact�vel.

Os povos que vivem sob regimes particularmente repressivos come�am naturalmente tirando proveito de qualquer foco de resist�ncia j� existente. Em 1978 as mesquitas iranianas eram o �nico lugar onde se podia criticar o regime do Sha. Ent�o as enormes manifesta��es convocadas por Khomeini, a cada 40 dias, come�aram a proporcionar seguran�a num�rica. Khomeini chegou dessa forma a ser reconhecido como um s�mbolo geral de oposi��o, inclusive pelos que n�o o seguiam. Mas tolerar qualquer l�der, mesmo enquanto mera figura representativa, �, na melhor das hip�teses, uma medida temporal que deveria ser abandonada t�o prontamente quanto poss�vel em favor de uma a��o mais independente � como fizeram aqueles trabalhadores petroleiros iranianos que no outono de 1978 acreditaram ter for�a suficiente para ir � greve em dias diferentes aos convocados por Khomeini.

A Igreja Cat�lica na Pol�nia estalinista jogou um papel igualmente amb�guo: o estado usou a Igreja para que lhe ajudasse a controlar o povo, mas o povo tamb�m usou a Igreja para que lhe ajudasse contra o estado.

Uma ortodoxia fan�tica � ami�de o primeiro passo em dire��o a uma auto-express�o mais radical. Pode ser que os extremistas isl�micos sejam altamente reacion�rios, mas o desenvolvimento do h�bito de tomar os acontecimentos em suas pr�prias m�os complicaram o retorno � �ordem� e poderiam inclusive, se n�o se iludissem, a chegar a ser genuinamente radicais � como ocorreu com parte da igualmente fan�tica guarda vermelha durante a �revolu��o cultural� na China, quando o que foi originalmente uma mera treta de Mao para deslocar alguns de seus rivais burocr�ticos conduziu finalmente � insurgencia incontrolada de milh�es de jovens que levaram a s�rio sua ret�rica antiburocr�tica.(1)

Convuls�es de p�s-guerra

Se algu�m proclamasse: �Eu sou o maior, a pessoa forte, mais nobre, mais inteligente e mais pac�fica do mundo�, seria considerado insuport�vel, sen�o louco. Mas se diz exatamente as mesmas coisas sobre seu pa�s � tido como um cidad�o admiravelmente patriota. O patriotismo � extremadamente sedutor porque permite ao indiv�duo mais miser�vel ligar-se a um vic�rio narcisismo coletivo. O afeto nost�lgico natural da fam�lia e da terra natal � transformado em um culto est�pido ao estado. Os medos e ressentimentos do povo se projetam at� ao estrangeiro enquanto suas aspira��es frustradas de uma comunidade aut�ntica se projetam misticamente em sua pr�pria na��o, que � vista de algum modo como essencialmente maravilhosa apesar de todos seus defeitos. (�Sim, a Am�rica tem seus problemas; mas estamos lutando pela Am�rica real, por tudo o que a Am�rica representa realmente.�) Esta consci�ncia m�stica de rebanho foi quase irresist�vel durante a guerra, sufocando finalmente toda tend�ncia radical.

N�o h� d�vida que �s vezes o patriotismo exerce uma fun��o oposta �s lutas radicais (p.e. Hungria 1956). A guerra �s vezes trabalha contra as revoltas. Mas aqueles que suportam a maior parte das cargas militares, supostamente em nome da liberdade e da democracia, podem reclamar ao voltar para casa uma parte justa de sua contribui��o. Participar da luta e adquirir o h�bito de destruir obst�culos os torna menos inclinados a crer em um status quo imut�vel.

As manobras e desilus�es produzidas pela I Guerra Mundial provocaram levantes por toda Europa. N�o aconteceu a mesma coisa na II Guerra Mundial porque o radicalismo genu�no foi destru�do pelo estalinismo, o fascismo e o reformismo; porque as justificativas dos vencedores para levar a cabo a guerra, carregadas de mentiras como sempre, vieram mais aceita��o do que de costume (os inimigos vencidos s�o obviamente os maus); e porque desta vez os vencedores cuidaram de elaborar antecipadamente o restabelecimento da ordem de p�s-guerra (entregando o leste da Europa a Stalin em troca da docilidade dos partidos comunistas franceses e italianos e o abandono do Partido Comunista Grego insurgente). N�o obstante, a eclos�o da guerra foi suficiente para abrir o caminho de uma revolu��o estalinista aut�noma na China (que Stalin n�o desejava, uma vez que ela amea�aria seu dom�nio exclusivo sobre o �campo socialista�) e para dar um novo �mpeto aos movimentos anticoloniais (que os poderes coloniais europeus naturalmente n�o queriam, embora fossem finalmente capazes de manter os aspectos mais proveitosos de sua domina��o atrav�s de um tipo de neocolonialismo econ�mico que os Estados Unidos j� estava praticando).

Ante a perspectiva de um vazio de poder no p�s-guerra, os dominadores passara a colaborar com freq��ncia com seus inimigos declarados para reprimir seu pr�prio povo. Ao t�rmino da guerra franco-germana de 1870-71 o ex�rcito alem�o vitorioso ajudou a sitiar a Comuna de Paris, possibilitando que os dominadores franceses a esmagassem com mais facilidade. Quando o ex�rcito estalinista se aproximou de Vars�via em 1944 convocou um levante popular na cidade contra os ocupantes nazis, depois esperou alguns dias fora da cidade enquanto os nazis suprimiam os elementos independentes que mais tarde poderiam resistir � imposi��o do estalinismo. Vimos recentemente algo similar na alian�a Bush-Saddam antes da guerra do Golfo, quando, depois de chamar o povo iraquiano a levantar-se contra Saddam, o ex�rcito americano massacrou sistematicamente aos iraquianos conscritos fugidos do Kuwait (os quais, se tivessem alcan�ado seu pais, estariam maduros para a revolta) ao mesmo tempo em que deixou a Guarda Republicana de elite de Saddam intata e livre para esmagar os grandes levantes ao norte e ao sul do Iraque.(2)

Em sociedades totalit�rias os agravos s�o �bvios, mas a revolta � dif�cil. Em sociedades �democr�ticas� as lutas s�o mais f�ceis, mas os objetivos est�o menos claros. Controlados em grande medida pelo condicionamento inconsciente ou por vastas e aparentemente incompreens�veis for�as (�o estado da economia�) e ante a oferta de uma ampla gama de elei��es aparentemente livres, torna-se dif�cil compreender nossa situa��o. Como um rebanho de ovelhas, somos conduzidos na dire��o que desejada, mas se deixa margem suficiente �s varia��es individuais para permitir preservar uma ilus�o de independ�ncia.

Os impulsos ao vandalismo e ao enfrentamento violento podem ser vistos �s vezes como tentativas de romper com esta abstra��o frustrante e para chegar a algo concreto.

Assim como a primeira organiza��o do proletariado cl�ssico foi precedida, entre finais do s�culo XVIII e princ�pios do s�culo XIX, por um per�odo de atos �criminosos� isolados, dirigidos � destrui��o das m�quinas de produ��o que privavam as pessoas de seu trabalho, assistimos atualmente � primeira apari��o de um vago vandalismo contra as m�quinas de consumo que nos privam igualmente da vida. � �bvio que neste caso o valor n�o est� na destrui��o pela destrui��o, mas na insubmiss�o que pode ser posteriormente transformada em um projeto positivo para reconverter as m�quinas no sentido de um incremento do poder real dos homens. [�Os dias ruins passar�o�, Internacional Situacionista # 7]

(� importante assinalar, todavia, que defender uma rea��o compreens�vel diante de um sintoma de crise social, n�o implica necessariamente ser uma t�tica recomend�vel).

Muitos outros fatores podem ser enumerados como estopim de situa��es radicais. Uma greve pode ampliar-se (R�ssia 1905); a resist�ncia popular a qualquer amea�a reacion�ria pode ultrapassar os limites oficiais (Espanha 1936); o povo pode tirar proveito de uma liberaliza��o simb�lica para ir mais al�m (Hungria 1956, Checoslov�quia 1968); um pequeno n�mero de a��es exemplares podem catalisar um movimento de massas (as primeiras ocupa��es pelos direitos civis nos Estados Unidos, maio de 1968 na Fran�a); um atropelo particular pode ser a gota d'�gua que faltava (Watts 1965, Los Angeles 1992); o colapso s�bito de um regime pode deixar um vazio de poder (Portugal 1974); uma ocasi�o especial pode reunir multid�es t�o numerosas que se torna imposs�vel evitar que expressem seus ressentimentos e aspira��es (Tiananmen 1976 e 1989); etc.

Mas uma crise social envolve tantos imponder�veis que poucas vezes � poss�vel prediz�-la, e muito menos provoca-la. Em geral parece que a melhor atitude � apoiar projetos que mais nos atraiam pessoalmente, ao mesmo tempo em que procuramos manter suficiente consci�ncia para reconhecer rapidamente novos desdobramentos significativos (perigos, tarefas urgentes, oportunidades favor�veis) que reclamem novas t�ticas.

A seguir, examinaremos alguns dos cen�rios decisivos das situa��es radicais j� desencadeadas.

* * *

Efervesc�ncia de situa��es radicais

Uma situa��o radical � uma revela��o coletiva. Em um extremo pode envolver algumas dezenas de pessoas em um bairro ou local de trabalho; em outro extremo se funda em uma situa��o revolucion�ria plena que envolve milh�es de pessoas. N�o � uma quest�o de n�mero, mas de participa��o e di�logo sempre p�blicos e abertos. O incidente que marcou a origem do Free Speech Movement [Movimento pela livre express�o] em 1964 � um exemplo cl�ssico e particularmente atraente. Quando a policia prendeu um ativista pelos direitos civis do campus da Universidade em Berkeley, alguns estudantes se sentaram diante da viatura policial; minutos depois centenas espontaneamente seguiram seu exemplo, rodeando a viatura de forma que esta n�o podia avan�ar. Durante as seguintes 32 horas a viatura policial se transformou em uma tribuna para o debate aberto. A ocupa��o de Sorbona em maio de 68 criou uma situa��o ainda mais radical ao atrair uma grande parte da popula��o parisiense n�o estudantil; e a ocupa��o das f�bricas pelos trabalhadores por toda a Fran�a se transformou em uma situa��o revolucionaria.

Em tais situa��es as pessoas se tornam muito mais suscet�veis para levar a cabo novas iniciativas, mais disposta a questionar antigas cren�as, mais animadas em desmascarar a farsa habitual. A cada dia algumas pessoas passam por experi�ncias que as faz questionar o sentido de suas vidas; mas durante uma situa��o radical praticamente todo mundo faz isso ao mesmo tempo. Quando a m�quina se det�m, as pr�prias pe�as come�am a questionar sua fun��o.

Os chefes s�o ridicularizados. As ordens n�o s�o respeitadas. As separa��es se dissolvem. Os problemas pessoais se convertem em quest�es p�blicas; as quest�es p�blicas que pareciam distantes e abstratas se transformam em um assunto imediatamente pr�tico. A velha ordem � examinada, criticada, satirizada. O povo aprende mais sobre a sociedade em uma semana do que em anos de �estudos sociais� acad�micos ou �tomada de consci�ncia� esquerdista. Experi�ncias longamente reprimidas s�o revividas.(3)Tudo parece poss�vel � e muito mais coisas vem � tona. O povo n�o acredita como pode suportar aqueles �velhos dias�. Embora o resultado seja incerto, a experi�ncia pode muitas vezes ser considerara em si mesma valiosa. �Apenas temos tempo... � escreveu um grafiteiro de maio de 68; ao que outros dois responderam: �Em todo caso, n�o nos arrependemos!� e �J� s�o tr�s dias de felicidade�.

Quando o trabalho se interrompe, o fren�tico ir e vir � substitu�do pela caminhada ociosa, o consumo passivo pela comunica��o ativa. Pessoas que n�o se conheciam estabelecem animadas conversa��es pelas esquinas. Os debates se sucedem sem parar, as pessoas que chegam substituem aqueles que marcham para outras atividades ou tratam de conseguir algumas horas de sono, embora ainda normalmente demasiado excitados para dormir por muito tempo. Enquanto alguns sucumbem aos demagogos, outros levam a cabo suas pr�prias propostas e tomam suas pr�prias iniciativas. Os espectadores se lan�am no torvelinho e passam por transforma��es incrivelmente r�pidas. (Em um belo exemplo de maio de 1968, o diretor do Teatro nacional Odeon se retirou consternado para o fundo do palco quando este foi tomado por multid�es radicais; mas depois de considerar a situa��o durante alguns minutos, avan�ou e exclamou: �Sim! Agora que o teatro � de voc�s, sejam seus defensores, nunca o entreguem a ningu�m � metam fogo nele antes de fazer isso!�) [citado no cap. 6 de Enrag�s y situacionistas en el movimiento de las ocupaciones]

Todavia, nem todo mundo � ganho imediatamente para a causa. Alguns simplesmente se retraem, aguardando o momento em que o movimento se aquiete para que possam recuperar suas posses e suas posi��es, e vingar-se. Outros vacilam, perdidos entre o desejo e o medo de mudan�a. O espa�o de alguns dias pode n�o ser suficiente para romper toda uma vida de condicionamento hier�rquico, a quebra dos h�bitos e rotinas pode ser t�o desorientadora quanto liberadora. As coisas acontecem de uma maneira t�o r�pida que � f�cil sentir p�nico. Mas mesmo conseguindo manter a calma n�o � f�cil compreender os fatores em jogo suficientemente r�pido para determinar o que fazer, que pode parecer �bvio a posteriori. Um dos principais prop�sitos deste texto � indicar algumas situa��es t�picas recorrentes, de forma que as pessoas possam estar preparadas para reconhecer e explorar tais oportunidades antes que seja demasiado tarde.

Situa��es radicais s�o raros momentos onde a mudan�a qualitativa chega a ser realmente poss�vel. Longe de ser anormais, revelam em que medida estamos quase sempre anormalmente reprimidos. Diante dessas situa��es a vida "normal" se assemelha a de um son�mbulo. Embora haja muitos livros escritos sobre revolu��es, poucos falam em profundidade sobre estes momentos. Os livros que tratam das revoltas modernas mais radicais quase sempre s�o meramente descritivos, aportando qui�� alguma insinua��o do que as pessoas sentem em tais experi�ncias, mas raramente efetuando alguma abordagem t�tica �til. Os estudos das revolu��es burguesas e burocratas s�o geralmente as menos relevantes. Em tais revolu��es, onde as "massas" jogaram apenas um papel de apoio tempor�rio em uma ou outra dire��o, sua conduta pode ser analisada em grande medida como movimentos de massas f�sicas, em termos metaf�ricos familiares como o movimento de fluxo e refluxo das mar�s, da oscila��o do p�ndulo entre a radicalidade e a rea��o, etc. Mas uma revolu��o anti-hier�rquica requer que as pessoas deixem de ser homog�neas, massas manipul�veis, que v� bem al�m do servilismo e da inconsci�ncia que lhes sujeitam este tipo de presivibilidade mecanicista.

Autoorganiza��o popular

Nos anos 60 pensava-se geralmente que a melhor maneira de favorecer a desmassifica��o era formar �grupos de afinidade�: pequenas associa��es de amigos com estilos de vida e perspectivas compat�veis. Formar tais grupos tinha muitas vantagens obvias. Podiam decidir sobre um projeto e leva-lo a cabo imediatamente; s�o dif�ceis de infiltrar; e podem vincular-se a outros quando necess�rio. Mas mesmo desconsiderando os diversos problemas sob os quais a maioria dos grupos de afinidade dos anos 60 sucumbiram, � preciso reconhecer o fato de que alguns assuntos requerem uma organiza��o em grande escala. Os grandes grupos logo acabam abra�ando a hierarquia a menos que logrem organizar-se de forma que l�deres sejam desnecess�rios.

Uma das formas mais simples para come�ar a organizar uma grande assembl�ia � fazer com que aqueles que tenham algo a dizer se organizem por turnos, fisicamente ou mediante listas, concedendo um certo tempo a cada um dentro do qual possam dizer o que queiram. (A assembl�ia de Sorbone e a concentra��o do Free Speech Movement estabeleceram um limite de tr�s minutos para cada um, que se estendia ocasionalmente por aclama��o popular.) Alguns dos oradores propunham projetos espec�ficos que resultavam em grupos menores e mais operativos. (�Alguns de n�s pretendemos fazer isto ou aquilo; qualquer um que queira tomar parte pode unir-se a n�s em tal hora ou lugar.�) Outros suscitavam temas relacionados com os objetivos gerais da assembl�ia e seu funcionamento permanente. (A quem incluir? Quando se reunir� de novo? Como tratar� nesse �nterim as novas quest�es urgentes? A quem se delegar�o problemas espec�ficos? Com que grau de responsabilidade?) Neste processo os participantes ver�o logo o que funciona ou n�o � com que rigor necessitam ser ordenados os delegados, se h� a necessidade de um moderador para facilitar a discuss�o para que n�o falem todos ao mesmo tempo, etc. S�o poss�veis muitos modos de organiza��o; o essencial � que as coisas prossigam abertas, democr�ticas e participativas, e que qualquer tend�ncia � hierarquia ou � manipula��o seja imediatamente exposta e recha�ada.

Free Speech Movement

Apesar de sua ingenuidade, confus�es e falta de uma rigorosa responsabilidade delegada, o Free Speech Movement � um bom exemplo das tend�ncias espont�neas � auto organiza��o pr�tica que surgem em uma situa��o radical. Se formaram duas dezenas de "centrais" para coordenar impress�o, comunicados de imprensa, assist�ncia legal, alimenta��o, sistemas de alto-falante e outras necessidades, ou encaminhar volunt�rios que indicaram suas habilidades e disponibilidades para diferentes tarefas. Centrais telef�nicas tornaram poss�vel contatar vinte mil estudantes em pouco tempo.

Mas al�m da mera quest�o de efici�ncia pr�tica, e dos temas pol�ticos ostensivos, os insurgentes romperam com toda fachada espetacular descobrindo o sabor da vida real, a comunidade real. Um participante estimou que em alguns meses chegou a conhecer, pelo menos vagamente, a duas ou tr�s mil pessoas - isto em um universo onde se procurava evitar "transformar pessoas em n�meros." Um outro escreveu comovido: "Quando nos defrontamos com uma institui��o aparente, desumana, deselegante, e insens�vel, frustradamente desenhada para despersonalizar e bloquear a comunica��o, descobrimos florescer em n�s uma presen�a por cuja aus�ncia protest�vamos de cora��o."(4)

Uma situa��o radical deve expandir-se ou fracassar. Em casos excepcionais um lugar particular pode servir como base mais ou menos permanente, um centro de coordena��o, um refugio da repress�o externa. (Sanrizuka, uma regi�o rural pr�xima a Tokyo ocupada pelos granjeiros locais nos anos 70 em um esfor�o para bloquear a constru��o de um novo aeroporto, este espa�o foi t�o fortemente defendido durante tantos anos que passou a ser utilizado como quartel geral de diversas lutas em todo Jap�o.) Mas uma localiza��o fixa facilita a manipula��o, a vigil�ncia, a repress�o, e o comprometimento com sua defesa inibe a liberdade das pessoas mover-se em derredor. As situa��es radicais se caracterizam sempre por uma grande movimenta��o: enquanto alguns convergem para locais chave para ver o que ocorre, outros se dispersam para ampliar a contesta��o para outras �reas.

Uma gest�o simples mas essencial em qualquer situa��o radical � que as pessoas comuniquem o que est�o fazendo e por qu�. Mesmo que se trate de algo mui limitado essa comunica��o � em si mesma exemplar: contribui para ampliar a luta incitando outros � participa��o, rompe com a usual depend�ncia dos rumores, dos meios espetaculares, e daqueles que d�o a si mesmos o t�tulo de porta-voz de outras pessoas.

� tamb�m um passo crucial de auto esclarecimento. Uma oportunidade de lan�ar um comunicado coletivo com alternativas concretas: Com quem queremos comunicar? Com que prop�sito? Quem est� interessado neste projeto? Quem est� de acordo com esta declara��o? Quem discorda? Em quais pontos? Tudo isso pode conduzir a uma polariza��o quando o povo percebe possibilidades diferentes na situa��o, pode levar a uma recomposi��o de pontos de vista, a um agrupamento das pessoas que compartilham da mesma opini�o para levar a cabo diversos projetos. Tal polariza��o esclarece pontos a todos. Cada tend�ncia segue livre para expressar-se e provar na pr�tica suas id�ias, e o resultado pode ser mais claramente discernido do que uma mescla de estrat�gias contradit�rias comprometidas com um m�nimo denominador comum.

Quando o povo encontra e reconhece uma necessidade pr�tica de coordena��o, se coordenar�; entretanto, a prolifera��o de indiv�duos aut�nomos � mais frutuosa que aquela "unidade" superficial organizada desde cima pela qual sempre apelam os burocratas.

As grandes multid�es muitas vezes permitem pessoas fazer coisas que seriam imprudentes quando feitas por indiv�duos isolados; e a��es coletivas, como greves e boicotes, exigem que as pessoas atuem harmoniosamente, ou pelo menos que n�o atuem contra a decis�o da maioria. Mas muitos outros assuntos podem ser decididos diretamente por indiv�duos ou por grupos pequenos. Melhor golpear quando o ferro est� quente que perder tempo tratando de debater as obje��es de massas de espectadores sob o dom�nio dos manipuladores.

Os situacionistas em maio de 1968

Os pequenos grupos tem todo o direito de escolher seus colaboradores: alguns projetos podem requerer capacidades espec�ficas ou um acordo pleno entre os participantes. Uma situa��o radical abre possibilidades mais amplas entre um setor mais amplo. Simplificar os temas b�sicos e romper com as separa��es habituais, faz que aquele aglomerado de pessoas comuns seja capaz de levar adiante tarefas habitualmente inimagin�veis uma semana antes. Em qualquer caso, as massas auto-organizadas s�o as �nicas que podem levar adiante determinadas tarefas � ningu�m pode fazer em seu lugar.

Qual � o papel dos indiv�duos radicais em tal situa��o? Est� claro que n�o devem afirmar que representam ou que lideram o povo. Por outro lado � absurdo, a pretexto de evitar hierarquias, propor "a dissolu��o da massa" e deixar de expor os pr�prios pontos de vista e de empreender os pr�prios projetos. N�o h� por que fazer menos que os indiv�duos ordin�rios "da massa", devem sim expressar seus pontos de vista e empreender seus pr�prios projetos ou nada em absoluto sucederia. Na pr�tica aqueles radicais que afirmam ter medo de �dizer �s pessoas o que fazer" ou de �atuar no lugar dos trabalhadores� terminam geralmente n�o fazendo nada ou desenrolando intermin�veis reitera��es de sua ideologia na forma de �informes de discuss�es entre alguns trabalhadores.� [cf. as cr�ticas da I.S � ICO em �Commencement d�une epoque� e �Preliminaires sur les conseils�.]

Os situacionistas e os Enrag�s tiveram uma pr�tica consideravelmente mais l�cida e direta em maio de 1968. Durante os primeiros tr�s ou quatro dias da ocupa��o de Sorbone (14-17 maio) expressaram abertamente seus pontos de vista acerca das tarefas da assembl�ia e do movimento em geral. Sobre a base daqueles pontos de vista um dos Enrag�s, Ren� Riesel, foi eleito para o primeiro Comit� de Ocupa��o de Sorbone, tanto ele como os demais delegados foram reeleitos no dia seguinte.

Riesel e outro delegado (os demais desapareceram aparentemente sem desempenhar suas responsabilidades) se esfor�aram por levar a cabo as duas pol�ticas que haviam defendido: manter a democracia total em Sorbone e difundir o mais amplamente poss�vel as chamadas � ocupa��o das f�bricas e a forma��o dos conselhos de trabalhadores. Mas quando a assembl�ia permitiu repetidamente que seu Comit� de Ocupa��o fosse objetado por varias burocracias esquerdistas n�o eleitas e deixou de afirmar a chamada aos conselhos oper�rios (negando portanto aos trabalhadores o est�mulo para que fizessem o que a pr�pria assembl�ia estava fazendo em Sorbone), os Enrag�s e os situacionistas abandonaram a assembl�ia e continuaram sua agita��o independentemente.

N�o houve nada de antidemocr�tico neste abandono: a assembl�ia de Sorbone seguiu livre para fazer o que bem entendesse. Mas quando deixou de responder �s tarefas urgentes que a situa��o exigia e passou a contradizer suas pr�prias pretens�es de democracia, os situacionistas sentiram que aquela assembl�ia j� n�o poderia ser considerada como um ponto focal do movimento. Este diagn�stico foi confirmado pelo colapso que se seguiu a qualquer pretens�o de democracia participativa na Sorbone: depois de sua partida a assembl�ia j� n�o mais fez elei��es, convertendo-se ao estilo t�pico da esquerda burocr�tica empurrando suas decis�es garganta abaixo das massas passivas.

Enquanto isso ocorria entre cerca de mil pessoas em Sorbone, milh�es de trabalhadores ocupavam suas f�bricas em todo o pa�s. (Da� o absurdo de caracterizar maio de 1968 como um �movimento estudantil.�) Os situacionistas, os Enrag�s e umas dezenas de outros revolucion�rios conselhistas formaram o Conselho para a Manuten��o das Ocupa��es (CMDO) com o objetivo de incitar estes trabalhadores a prescindir dos burocratas sindicais e vincularem-se diretamente uns aos outros para realizar as possibilidades radicais que sua a��o colocara em andamento.(5)

* * *

O obrerismo est� obsoleto, mas a posi��o dos trabalhadores prossegue sendo central

�A indigna��o virtuosa � um poderoso estimulante, mas constitui uma dieta perigosa. � bom recordar o velho prov�rbio: a c�lera � m� conselheira. . . . Ali onde tuas simpatias est�o fortemente situadas, por alguma pessoa ou pessoas cruelmente maltratadas, das quais n�o sabes nada exceto que s�o maltratadas, tua generosa indigna��o lhes atribui toda sorte de virtudes, e toda sorte de v�cios �queles que as oprimem. Nas a verdade nua e crua � que as pessoas maltratadas s�o piores que as bem tratadas.�

�George Bernard Shaw, The Intelligent Woman�s
Guide to Socialism and Capitalism

�Aboliremos os escravos porque n�o suportamos olhar em seus olhos.�

�Nietzsche


Lutar pela liberta��o n�o sup�e assumir os tra�os do oprimido. A mais extrema injusti�a da opress�o social � que provavelmente ela degrada mais do que enobrece suas v�timas.

Grande parte da ret�rica esquerdista tradicional procede de no��es obsoletas da �tica do trabalho: o burgu�s seria mau porque n�o realiza nenhum trabalho produtivo, enquanto que os honor�veis prolet�rios mereceriam os frutos de seu trabalho, etc. Com o trabalho tornando-se a cada vez mais desnecess�rio e dirigido para fins cada vez mais absurdos, esta perspectiva perdeu todo o sentido que porventura teve algum dia. A quest�o n�o � elogiar o proletariado, mas aboli-lo.

A domina��o de classe n�o desapareceu com um s�culo inteiro de demagogia esquerdista fazendo parte da velha terminologia radical soar de forma suficientemente aud�vel. Na medida em que desaparece gradualmente certos tipos de trabalho manual tradicional, setores inteiros da popula��o s�o condenados ao desemprego permanente. Assim, o capitalismo moderno prossegue proletarizando quase todos os demais. Mec�nicos, t�cnicos, e inclusive profissionais de classe media que antigamente se ufanavam de sua independ�ncia (m�dicos, cientistas, acad�micos) est�o cada vez mais sujeitos � mais crua comercializa��o, inclusive a uma arregimenta��o semelhante a uma linha de montagem.

Menos de 1% da popula��o mundial possui 80% do territ�rio. Inclusive nos Estados Unidos, os supostamente mais igualit�rios, a disparidade econ�mica � extrema e a cada dia se torna ainda mais extrema. H� vinte anos o sal�rio m�dio de um alto dirigente era 35 vezes maior que o sal�rio m�dio do oper�rio de fabrica; hoje esse sal�rio � 120 vezes maior. H� vinte anos 0,5% dos mais ricos da popula��o estadunidense possu�a 14% da riqueza privada total; agora possuem 30% dessa riqueza. Nas tais propor��es n�o d�o a medida completa do poder desta elite. A �riqueza� das classes media e baixa � dedicada quase que inteiramente a cobrir suas necessidades cotidianas, restando pouco ou nada para inverter em qualquer plano significativo que proporcione poder social. Um magnata que possui apenas cinco ou dez por cento de uma sociedade an�nima pode normalmente controla-la (devido � apatia da massa n�o organizada de pequenos acionistas), exercendo assim tanto poder como se possu�sse toda a corpora��o. E bastam apenas algumas poucas corpora��es maiores (cujos dirigentes est�o estreitamente inter-relacionados uns com os outros e com as burocracias mais altas do governo) para comprar, suprimir ou marginalizar os competidores independentes menores, e para efetivamente controlar tanto os pol�ticos chave como os meios de comunica��o de massa.

O espet�culo onipresente da prosperidade da classe media est� ocultando essa realidade, especialmente nos Estados Unidos onde, devido � sua historia particular (e apesar da viol�ncia de muitos de seus conflitos de classe do passado), o povo � mais ingenuamente inconsciente das divis�es de classe que em qualquer outra parte do mundo. A extensa variedade de etnias e as mir�ades de complexas grada��es intermedi�rias tem amortecido e obscurecido a distin��o fundamental entre dominantes e dominados. Os estadunidenses possuem mercadorias o suficiente para n�o prestar aten��o ao fato de que alguns possuem toda a sociedade. Exceto aqueles que est�o mais abaixo, n�o podem evitar de perceber melhor estas coisas, mas mesmo assim geralmente assumem que a pobreza � culpa dos pobres, que qualquer pessoa empreendedora sempre encontrar� muitas oportunidades, que se n�o pode ter uma vida satisfat�ria num lugar sempre pode encontrar um novo ponto de partida em outro. H� um s�culo, quando as pessoas simplesmente tinham que deslocar-se mais a oeste, esta cren�a tinha algum fundamento; a persist�ncia do espet�culo nost�lgico da fronteira obscurece o fato de que as condi��es presentes s�o muito diferentes, j� n�o temos nenhum lugar para onde ir.

Os situacionistas utilizam �s vezes o termo proletariado (ou mais precisamente, o novo proletariado) em um sentido amplo para referir-se a �todos aqueles que n�o tem poder sobre suas pr�prias vidas e sabem disso.� Este uso pode ser pouco rigoroso, mas tem o m�rito de acentuar o fato de que a sociedade est� dividida em classes, e que a divis�o fundamental se d� entre alguns que possuem e controlam tudo e o restante que tem pouco ou nada que trocar ou vender sen�o sua pr�pria for�a de trabalho. Em alguns contextos pode ser prefer�vel utilizar outros termos, como �o povo�; mas n�o quando esto contribui para misturar indiscriminadamente exploradores com explorados.

N�o se trata de romantizar aos trabalhadores assalariados que, n�o surpreendentemente, considerando que o espet�culo � desenhado sobretudo para mante-los enganados, est�o com freq��ncia entre os setores mais ignorantes e reacion�rios da sociedade. N�o se trata de ponderar diferentes agravos para ver quem est� mais oprimido. Toda forma de opress�o deve ser contestada, e todos podem contribuir nesta contesta��o � mulheres, jovens, desempregados, minorias, lumpen, bo�mios, camponeses, classes medias, e inclusive renegados da elite dominante. Mas nenhum destes grupos pode alcan�ar uma libera��o definitiva sem abolir o fundamento material de todas estas opress�es: o sistema de produ��o de mercadorias e o trabalho assalariado. E esta libera��o s� pode ser alcan�ada mediante a auto-aboli��o coletiva dos trabalhadores assalariados. Apenas eles tem a capacidade n�o s� para conduzir diretamente � supress�o de todo o sistema, como tamb�m para por de novo as coisas em marcha de um modo fundamentalmente novo.(6)

N�o se trata de conceder privil�gios especiais a ningu�m. Os trabalhadores dos setores essenciais (alimenta��o, transporte, comunica��es, etc.) que recha�arem a seus chefes capitalistas e sindicatos, e come�arem a autogerir suas atividades n�o ter�o obviamente interesse em defender o �privilegio� de fazer todo o trabalho; pelo contrario, ter�o um vivo interesse em convidar aos outros, sejam n�o trabalhadores ou trabalhadores de setores obsoletos (justi�a, ex�rcito, comercio, publicidade, etc.), a unir-se a seu projeto para reduzi-lo e transforma-lo. Qualquer um que tome parte cooperar� na tomada de decis�es; s� ficar�o fora aqueles que permanecerem a dist�ncia reclamando privil�gios especiais.

O sindicalismo e o conselhismo tradicionais se inclinaram excessivamente a assumir a divis�o de trabalho existente como algo definitivo, como se a vida das pessoas em uma sociedade p�s-revolucion�ria continuasse girando ao redor de trabalhos e locais de trabalho fixos. Inclusive dentro da atual sociedade tal perspectiva est� se tornando cada vez mais obsoleta: na medida em que a maioria das pessoas tem trabalhos absurdos e com freq��ncia apenas temporais, n�o se identifica de nenhuma forma com eles, e muitos outros n�o trabalham em absoluto no mercado assalariado, os temas relativos ao trabalho se convertem simplesmente em um aspecto de luta mais geral.

A princ�pio, pode convir ao movimento que os trabalhadores se identifiquem como tais. (�Nos, trabalhadores de tal ou qual companhia, ocupamos nosso local de trabalho com tais ou quais objetivos; urgimos aos trabalhadores de outros setores a fazer o mesmo.�) A meta �ltima, naturalmente, n�o � a autogest�o das empresas existentes. Pretender, digamos, que os trabalhadores dos meios de comunica��o de massa assumam o controle sobre eles apenas porque casualmente trabalham ali seria t�o arbitr�rio quanto o controle atual por parte de qualquer um que casualmente os possua. A gest�o dos trabalhadores das condi��es particulares de seu trabalho dever� combinar-se com a gest�o por parte da comunidade dos assuntos de incumb�ncia geral. Donas de casa e outros que trabalham em condi��es relativamente particulares ter�o que desenvolver suas pr�prias formas de organiza��o que lhes capacitem para expressar seus interesses particulares. Mas os conflitos potenciais de interesses entre �produtores� e �consumidores� ser�o rapidamente superados quando todos estiverem diretamente envolvidos em ambos aspectos; quando os conselhos de trabalhadores se interrelacionarem com os conselhos de comunidades e de bairro; e quando as posi��es de trabalho fixas gradualmente se extinguirem mediante a obsolesc�ncia da maioria dos trabalhos e a reorganiza��o e rota��o daqueles que se mantenham (inclusive o trabalho dom�stico e o cuidado das crian�as).

Os situacionistas estavam verdadeiramente no caminho correto lutando pela forma��o dos conselhos oper�rios durante as ocupa��es de f�bricas em maio de 1968. Mas � digno de nota que tais ocupa��es tiveram in�cio mediante a��es da juventude em grande medida n�o trabalhadora. Os situacionistas posteriores a maio de 68 tenderam a cair em uma esp�cie de obrerismo (se bem que com uma �tica decisivamente anti-obrerista), contemplando a prolifera��o de greves selvagens como o melhor indicador das possibilidades revolucionarias ao mesmo tempo em que dedicavam menos aten��o no desenvolvimento de outras �reas de a��o. Na realidade ocorre freq�entemente que os oper�rios que s�o pouco radicais em outros aspectos s�o for�ados a unir-se a lutas selvagens pelo simples fato da descarada trai��o de seus sindicatos; por outro lado, pode-se resistir ao sistema de muitas outras formas al�m de greves (incluindo em primeiro lugar evitar o trabalho assalariado na medida do poss�vel). Os situacionistas reconheceram corretamente a autogest�o coletiva e a �subjetividade radical� do indiv�duo como aspectos complementares e igualmente essenciais do projeto revolucion�rio, mas sem conseguir uni-las completamente (certamente o fizeram de forma mais restrita que os surrealistas, que, por sua vez, vincularam a revolta pol�tica e cultural declarando sua fervorosa ades�o a uma ou outra vers�o da ideologia bolchevique).(7)

Greves selvagens e ocupa��es

As greves selvagens proporcionam possibilidades interessantes, especialmente se os grevistas ocupam seu lugar de trabalho. Isto n�o s� torna sua posi��o mais segura (previne o fechamento e os fura-greves, e as m�quinas e produtos servem como ref�ns contra a repress�o), como re�ne a todos, garantindo praticamente a autogest�o coletiva da luta e insinuando a id�ia da autogest�o integral da sociedade sociedade.

Uma vez que o funcionamento habitual da f�brica � interrompido tudo adquire um aspecto diferente. Um triste local de trabalho pode transfigurar-se em um espa�o quase sagrado, zelosamente guardado contra a intrus�o profana dos chefes ou da pol�cia. Um observador da ocupa��o de 1937 em Flint, Michigan, descreveu aos grevistas como �crian�as jogando um novo e fascinante jogo. Fizeram um pal�cio do que havia sido sua pris�o.� (Citado em Sit-Down: The General Motors Strike of 1936-1937, de Sidney Fine.) Embora o objetivo da greve fosse simplesmente conquistar o direito de sindicaliza��o, sua organiza��o foi praticamente conselhista. Nas seis semanas que viveram em sua f�brica (utilizando como camas bancos de carro e carrocerias como arm�rios) uma assembl�ia geral de todos os 1200 trabalhadores se reunia duas vezes por dia para determinar pol�ticas relativas a alimenta��o, sa�de, informa��o, educa��o, reclama��es, comunica��o, seguran�a, defesa, desportos e entretenimentos, e para eleger comit�s respons�veis e freq�entemente rotativos para leva-las a cabo. Houve inclusive um Comit� de Rumores, cujo prop�sito era rebater a desinforma��o averiguando a fonte e provando a validez de cada rumor. Fora da f�brica, as mulheres dos grevistas se ocupavam de reunir comida e organizar piquetes, publicidade, e coordena��o com os trabalhadores de outras cidades. Algumas das mais audazes organizaram uma Brigada de Imerg�ncia de Mulheres que tirou um plano de conting�ncia para formar uma zona de choque em caso de um ataque da pol�cia contra a f�brica. �Se a pol�cia quer disparar ter� que faz�-lo contra n�s.�

Desafortunadamente, embora os trabalhadores mantenham uma posi��o central em algumas �reas cruciais (servi�os, comunica��o, transporte), em outros setores tem menor capacidade que no passado. As companhias multinacionais tem normalmente amplas reservas e podem ag�entar mais que os trabalhadores ou transferir opera��es a outros pa�ses, enquanto que os trabalhadores tem que resistir um tempo duro sem entrada de sal�rio. Longe de resultar em algo essencial, muitas greves atuais s�o meras chamadas propondo o fechamento de industrias obsoletas que est�o perdendo dinheiro. Assim, embora a greve siga sendo a t�tica mais b�sica dos trabalhadores, eles devem tamb�m inventar outras formas de luta no trabalho e encontrar vias de rela��o com lutas em outros terrenos.

Greves de consumo

Como as greves oper�rias, as greves de consumo (boicotes) dependem tanto do poder que podem exercer como do apoio que podem recrutar. H� tantos boicotes a favor de tantas causas que, exceto em alguns casos baseados em algum tema moral notavelmente claro, a maioria fracassa. Como ocorre com freq��ncia nas lutas sociais, as greves de consumidores mais frut�feras s�o aquelas em que as pessoas est�o lutando diretamente por si mesmas, como os antigos boicotes pelos direitos civis no sul dos Estados Unidos ou os movimentos de �autoredu��o� na It�lia e outros lugares em que comunidades inteiras decidiram pagar apenas um determinado percentual das faturas ou dos bilhetes dos meios de transportes. Uma greve de renda � uma a��o particularmente simples e poderosa, mas dificilmente alcan�a o grau de unidade necess�rio para ter in�cio exceto entre aqueles que n�o tem nada que perder; � por isto que os maiores desafios exemplares ao fetiche da propriedade privada est�o sendo levados a cabo por okupas sem teto.

Naquilo que pode ser chamado de boicote ao avesso, o povo as vezes se une para apoiar alguma institui��o popular que est� sob amea�a. Reunir dinheiro para una escola ou biblioteca local ou institui��o alternativa � normalmente bastante banal, mas tais movimentos geram ocasionalmente um debate p�blico saud�vel. Em 1974 jornalistas em greve tomaram um peri�dico importante da Corea do Sul e come�aram a publicar exposi��es das mentiras e repress�o governamentais. Em um esfor�o por arruinar o peri�dico sem ter que suprimi-lo abertamente, o governo pressionou a todos os anunciantes para que retirassem seus an�ncios do peri�dico. O p�blico respondeu comprando milhares de an�ncios individuais, utilizando seu espa�o para manifesta��es pessoais, poemas, cita��es de Tom Paine, etc. A �Coluna de Apoio � Liberdade de Express�o� teve um incremento de p�ginas a cada n�mero e sua circula��o cresceu sucessivamente at� que o peri�dico foi finalmente suprimido.

Mas as lutas de consumidores s�o limitadas pelo fato de que os consumidores s�o os receptores finais do ciclo da economia: podem exercer uma certa press�o mediante protestos, boicotes ou dist�rbios, mas n�o controlam os mecanismos de produ��o. No incidente coreano mencionado acima, por exemplo, a participa��o do p�blico s� foi poss�vel gra�as � tomada do peri�dico por parte dos trabalhadores.

Uma forma particularmente interessante e exemplar de luta oper�ria � o que se chama as vezes �greve social� ou �greve de doa��o�, onde as pessoas prosseguem, com seus trabalhos mas de forma que prefigure uma ordem social livre: os trabalhadores distribuem gratuitamente os bens que produzem, os empregados cobram menos da clientela, os trabalhadores do transporte permitem circular livremente os passageiros. Em fevereiro de 1981, 11.000 trabalhadores de telefones ocuparam as centrais atrav�s de toda a Columbia Brit�nica e mantiveram todos os servi�os de telefone sem cobran�a durante seis dias antes de serem enganados pelo sindicato e abandonassem aquela empreitada. Al�m de conseguir muitas vit�rias, parece que passaram um tempo maravilhoso.(8) Pode-se imaginar muitas formas de ir al�m e chegar a ser mais seletivos, como bloquear chamadas comerciais e governamentais enquanto se permite que se ocorram livremente as chamadas pessoais. Os trabalhadores postais poderiam fazer o mesmo com as cartas; os de transporte poderiam continuar enviando bens necess�rios enquanto recha�am transportar a pol�cia ou tropas militares...

Mas este tipo de greve n�o teria sentido para a grande maioria de trabalhadores cujos trabalhos n�o servem a um prop�sito sensato. (O melhor que estes trabalhadores podem fazer � denunciar publicamente o absurdo de seu pr�prio trabalho, como fizeram alguns publicit�rios durante maio de 1968.) Mais ainda, at� mesmo o trabalho �til � t�o freq�entemente dividido que os grupos separados de trabalhadores podem aportar poucas mudan�as por si mesmos. E a pequena minoria que consegue produzir produtos acabados e comercializ�veis (como fizeram os trabalhadores que em 1973 tomaram a f�brica falida de rel�gios Lip em Besan�on, Fran�a, fazendo-a voltar a funcionar por eles mesmos) continua normalmente dependendo do financiamento comercial e das redes de distribui��o. Quando excepcionalmente tais trabalhadores conseguem prosperar por eles mesmos, simplesmente tornam-se uma companhia capitalista a mais; mais freq�entemente, suas inova��es autogeridas acabam simplesmente racionalizando a opera��o em beneficio dos propriet�rios. Uma �Estrasburgo fabril � s� pode ocorrer se os trabalhadores que se encontram em uma situa��o como a da Lip utilizam as facilidades e a publicidade de forma que lhes permita ir mais longe que os trabalhadores da Lip (que lutavam simplesmente para salvar seus empregos) chamando outros a unir-se a eles na supera��o de todo o sistema de produ��o mercantil e do trabalho assalariado. Mas � pouco prov�vel que isto ocorra at� que surja um movimento suficientemente amplo que aumente as perspectivas das pessoas e compense os riscos � como em maio de 1968, quando a maioria das f�bricas da Fran�a estavam ocupadas:

O que poderia ter sucedido em maio de 1968

Se, em uma simples e grande f�brica, entre 16 e 30 de maio, fosse constitu�da uma assembl�ia geral enquanto um conselho com todos os poderes de decis�o e execu��o, expulsando os burocratas, organizando sua autodefesa e convocando os grevistas de todas as empresas a se unirem a eles, este passo qualitativo poderia levar imediatamente o movimento ao seu momento decisivo. . . . Um n�mero mui amplo de empresas seguiria o caminho aberto dessa forma. Esta f�brica poderia imediatamente tomar o lugar da duvidosa e em todos os sentidos exc�ntrica Sorbone dos primeiros dias e chegar a ser o centro real do movimento das ocupa��es: delegados genu�nos dos numerosos conselhos que praticamente j� existiam em alguns dos edif�cios ocupados, conselhos que poderiam se impor em todos os ramos da industria reunidos nessa base. Tal assembl�ia poderia proclamar a expropria��o de todo capital, incluindo o capital do estado; anunciar que todos os meios de produ��o do pais seriam dali em diante propriedade coletiva do proletariado organizado em democracia direta; e chamar diretamente (apoderando-se finalmente de alguns meios de telecomunica��o, por exemplo) aos trabalhadores do mundo inteiro a apoiar esta revolu��o. Alguns dir�o que tal hip�tese � ut�pica. N�s respondemos: foi precisamente por isso, pelo movimento das ocupa��es estar objetivamente em muitos momentos a apenas uma hora deste resultado, que infundiu tanto terror, inteiramente vis�vel para qualquer um diante da impot�ncia do estado, do p�nico do Partido Comunista, e da conspira��o silenciosa mantida no que dizia respeito a sua gravidade. ["O come�o de uma nova �poca", Internacional Situacionista # 12]

Os que impediram que isto sucedesse foram sobretudo os sindicatos, particularmente o maior do pais: a CGT dominada pelo Partido Comunista.

Inspirados pela juventude rebelde que havia combatido a pol�cia nas ruas e tomado Sorbone e outros edif�cios p�blicos, dez milh�es de trabalhadores ignoraram seus sindicatos e ocuparam praticamente todas as f�bricas e muitos dos escrit�rios do pa�s, lan�ando a primeira greve geral de ocupa��o da historia. Mas a maioria daqueles trabalhadores ficaram sem saber o que fazer depois que permitiram que a burocracia sindical se insinuasse naquele movimento que no primeiro momento trataram de impedir. Os burocratas fizeram tudo que puderam para romper e fragmentar o movimento: chamaram greves rel�mpago, criaram falsas "organiza��es de base" compostas por fieis membros do Partido Comunista; se apossaram dos sistemas de alto-falante; chamaram vota��es defendendo o retorno ao trabalho; e o mais crucial: o fecharam as portas da f�brica para manter os trabalhadores isolados uns dos outros e dos outros insurgentes (com o pretexto de "defender-se contra os provocadores de fora"). Os sindicatos a seguir abriram negocia��es com os empres�rios e o governo em torno de um pacote de bonifica��es salariais e folgas. Este suborno foi recha�ado enfaticamente por uma ampla maioria de trabalhadores, que tinham uma no��o, embora confusa, de que cabia uma proposta mais radical na agenda. Nos primeiros dias de junho, De Gaulle apresentou a alternativa pau ou cenoura, novas elei��es ou guerra civil, isso finalmente intimidou a muitos trabalhadores, que voltaram ao trabalho. Houve todavia numerosa resist�ncia, mas o isolamento uns dos outros permitiu aos sindicatos dizer a cada grupo que todos os demais haviam retornado ao trabalho, na medida que acreditavam que estavam sozinhos, renunciavam.

* * *

M�todos de confus�o e coopta��o

Como em maio de 1968, quando os pa�ses mais desenvolvidos se v�em amea�ados por uma situa��o radical, utilizam normalmente a confus�o, as concess�es, toques de recolher, distra��es, desinforma��o, fragmenta��o, antecipa��o, posterga��o e outros meios para desviar a aten��o, dividindo e cooptando a oposi��o, reservando a repress�o f�sica aberta como �ltimo recurso. Esses m�todos, que v�o da sutileza ao rid�culo,(9) s�o t�o numerosos que seria imposs�vel mencionar aqui mais do que alguns.

Um m�todo comum para confundir os problemas � distorcer a composi��o aparente de for�as projetando diversas posi��es em um esquema linear, esquerda contra direita, implicando que se te op�es a um dos lados est�s a favor do outro. O espet�culo do comunismo contra o capitalismo serviu a este prop�sito durante meio s�culo. A partir do recente colapso desta farsa, a tend�ncia passou a ser declarar um consenso pragm�tico global centrista, agrupando toda oposi��o como �extremistas� lun�ticos-marginais (fascismo e fanatismo religioso � direita, terrorismo e �anarquia� � esquerda).

O cl�ssico m�todo do dividir-para-reinar anteriormente discutido: fazer com que os explorados se fragmentem em uma multid�o de identidades grupais fechadas, que podem ser manipuladas dirigindo suas energias a disputas uns contra os outros. Ao inverso, podem unir-se �s classes oponentes mediante a histeria patri�tica ou outros meios. As frentes populares, as frentes unidas e coaliz�es similares servem para obscurecer os conflitos fundamentais de interesses em nome de uma oposi��o unida frente ao inimigo comum (burguesia + proletariado contra regime reacion�rio; estratos militares e burocr�ticos + camponeses contra a domina��o estrangeira). Em tais coaliz�es o grupo superior geralmente tem os recursos materiais e ideol�gicos para manter seu controle sobre o grupo inferior, que � obrigado a adiar a a��o auto-organizada por e para si mesmo at� que seja demasiado tarde. Quando se obt�m a vit�ria sobre o inimigo comum, o grupo superior consolida seu poder (com freq��ncia mediante uma nova alian�a com elementos do grupo derrotado) para esmagar os elementos radicais do grupo inferior.

Qualquer vest�gio de hierarquia dentro de um movimento radical ser� utilizado para dividi-lo e min�-lo. Se n�o houver l�deres cooptaveis, s�o criados mediante uma intensiva exposi��o medi�tica. Os governantes podem negociar com os l�deres e torn�-los respons�veis por um dominio de seus seguidores; uma vez cooptados, podem tamb�m estabelecer redes similares de comando, possibilitando que uma grande massa de gente seja colocada sob controle sem que os dominadores tenham que tratar com todos eles aberta e simultaneamente.

A coopta��o de l�deres serve n�o apenas para separa-los das pessoas, mas tamb�m para dividir as pessoas entre si� alguns v�em a coopta��o como uma vitoria, outros a denunciam, outros duvidam. Como a aten��o se desloca desde a��es participativas at� o espet�culo das celebridades, l�deres distantes que debatem temas distantes, a maioria das pessoas se aborrece e se desilude. Ao sentir que os assuntos est�o fora de seu alcance (talvez inclusive secretamente aliviada de que outro se ocupe deles), voltam � sua antiga passividade.

Outro m�todo para desanimar a participa��o popular � enfatizar problemas que parecem requerer habilidades especializadas. Um exemplo cl�ssico foi o estratagema usado por certos chefes militares alem�es em 1918 no momento em que conselhos de trabalhadores e soldados emergiam em conseq��ncia do colapso alem�o ao final da I Guerra Mundial, tais chefes militares ficaram potencialmente com o pais em suas m�os.(10)

O terrorismo refor�a o Estado

O terrorismo freq�entemente tem servido para enfraquecer o impulso das situa��es radicais. O terrorismo deixa as pessoas confusas, converte-as em espectadores que buscam ansiosamente as �ltimas not�cias e especula��es. Longe de debilitar o estado, o terrorismo parece confirmar a necessidade de refor��-lo. Se os espet�culos terroristas n�o surgem espontaneamente quando os poderosos precisam dele, o pr�prio estado pode produzi-los mediante provocadores. (Ver Sobre o terrorismo e o estado de Sanguinetti e a �ltima parte do Prefacio � quarta edi��o italiana da �Sociedade do espet�culo.� de Debord). O movimento popular pode impedir que alguns indiv�duos levem a cabo a��es terroristas ou outras a��es irrefletidas que podem desvia-lo de seu prop�sito e destrui-lo t�o seguramente como se fosse obra de um provocador. A �nica solu��o � criar um movimento com t�ticas t�o firmemente consistentes e n�o manipulativas a ponto de que qualquer pessoa possa reconhecer tanto a estupidez individual como as provoca��es da pol�cia.

Uma revolu��o anti-hier�rquica deve ser uma �conspira��o aberta.� Obviamente h� coisas que requer segredo, especialmente sob os regimes mais repressivos. Mas mesmo em tais casos os meios n�o deveriam ser inconsistentes com a meta �ltima: a supress�o de todo poder separado mediante a participa��o consciente de todos. O segredo tem com freq��ncia o resultado absurdo de que a pol�cia � a �nica que sabe o que est� passando, e pode assim infiltrar e manipular um grupo radical sem que ningu�m mais tenha consci�ncia disso. A melhor defesa contra a infiltra��o � assegurar-se de que n�o h� nada t�o importante que justifique uma infiltra��o, ou seja, que nenhuma organiza��o radical exer�a um poder separado. A melhor salvaguarda est� no n�mero: uma vez que milhares de pessoas est�o abertamente mescladas entre si, n�o ocorre absolutamente nada se alguns poucos espi�es se infiltram entre eles.

Inclusive em a��es de pequenos grupos a seguran�a depende com freq��ncia de um m�ximo de publicidade. Quando alguns dos participantes no esc�ndalo de Estrasburgo come�aram a ter medo e sugeriram moderar as coisas, Mustapha Khayati (o delegado da IS que foi o principal autor do panfleto Sobre a mis�ria no meio estudantil) prop�s que a atitude mais segura n�o deveria ser evitar ofender demasiado �s autoridades � como se insultar apenas moderada e indecisamente resultasse em elogios! � mas perpetrar um esc�ndalo t�o amplamente divulgado que n�o pudesse sofrer repres�lias.

* * *

O momento decisivo

Voltando �s ocupa��es de f�bricas de maio de 1968, suponhamos que os trabalhadores franceses recha�assem as manobras dos burocratas e estabelecessem uma rede conselhista atrav�s de todo o pais. O que sucederia?

Diante de tal eventualidade, a guerra civil seria naturalmente inevit�vel. . . . A contra-revolu��o armada sairia imediatamente a campo. Mas sem certeza de que iria vencer. Parte das tropas obviamente se amotinaria. Os trabalhadores aprenderiam pegar em armas, e certamente n�o construiriam mais nenhuma outra barricada (uma bela forma de express�o pol�tica no come�o do movimento, mas obviamente rid�cula do ponto de vista estrat�gico). . . . A interven��o estrangeira se produziria inevitavelmente . . . Provavelmente come�ando pelas for�as da OTAN, mas com o apoio direto ou indireto do Pacto de Vars�via. Mas tudo dependeria mais uma vez do proletariado europeu: tudo ou nada. [�O come�o de uma nova �poca�, Internacional Situacionista, # 12]

A grosso modo, o significado da luta armada varia de modo inverso ao grau de desenvolvimento econ�mico. Nos pa�ses mais subdesenvolvidos as lutas sociais tendem a reduzir-se a lutas militares, porque as massas empobrecidas pouco podem fazer sem armas diante dos danos provocados pelos dominadores, especialmente quando sua tradicional auto-sufici�ncia foi destru�da por uma economia de monocultivo destinada � exporta��o. (Mas mesmo se vencem militarmente, podem ser normalmente dominados pela interven��o estrangeira ou pressionados a submeter-se � economia mundial, a menos que outras revolu��es paralelas em outros lugares abram novas frentes.)

Nos pa�ses mais desenvolvidos a for�a armada tem relativamente menor significado, embora possa, eventualmente, ser um fator importante em certas conjunturas cr�ticas. � poss�vel, embora n�o muito eficiente, for�ar pessoas a fazer trabalhos manuais simples sob a mira de uma pistola. Mas n�o � poss�vel fazer isso com pessoas que trabalham com papel ou ordenadores dentro de uma sociedade industrial complexa � h� ali demasiadas oportunidades de fastidiosos �erros� dos quais resulta imposs�vel averiguar o autor. O capitalismo moderno requer uma certa coopera��o e inclusive uma participa��o semi-criativa de seus trabalhadores. Nenhuma grande empresa poderia funcionar um �nico dia sem a autoorganiza��o espont�nea dos trabalhadores, que reagem diante de problemas imprevistos, compensam erros dos gestores, etc. Se os trabalhadores se comprometem em uma greve �de zelo� onde n�o fa�am outra coisa sen�o seguir estritamente todos os regulamentos oficiais, o funcionamento total ser� retardado ou at� mesmo completamente interrompido (conduzindo os dirigentes, que n�o podem condenar abertamente tal rigor, a uma posi��o divertidamente delicada ao ter que recomendar que os trabalhadores cumpram com seu trabalho sem ser demasiadamente rigorosos). O sistema sobrevive apenas porque a maioria dos trabalhadores s�o relativamente ap�ticos e, para n�o criar problemas, cooperam o suficiente para que as coisas marchem.

As revoltas isoladas podem ser reprimidas de modo individual; mas se um movimento se amplia suficientemente r�pido, como en maio de 1968, centenas de milhares de soldados e policiais nada podem fazer diante de milh�es de trabalhadores em greve. Tal movimento apenas pode ser destru�do de dentro para fora. Se as pessoas n�o sabem o que fazer, as armas n�o podem ajuda-las; se sabem o que fazer as armas n�o podem det�-las.

Apenas em certos momentos as pessoas ficam suficientemente �unidas� para rebelar-se com �xito. Os dominadores mais l�cidos sabem que s� est�o seguros enquanto puderem conter tais intentos antes de que desenvolvam demasiado impulso e autoconsci�ncia, seja mediante repress�o f�sica direta, seja mediante as varias esp�cies de desvios mencionados acima. Pouco importa se as pessoas se d�em conta mais tarde de que foram enganadas, que tiveram a vit�ria em suas m�os sem saber: uma vez que a oportunidade passou, j� � tarde demais.

Mesmo situa��es ordin�rias s�o plenas de confus�o, mas os problemas n�o s�o normalmente t�o urgentes. Em uma situa��o radical as coisas se simplificam na medida em que essa situa��o se acelera: os problemas se tornam mais claros, mas h� menos tempo para resolve-los.

Um caso extremo foi dramatizado na famosa cena de Potemkin de Eisenstein. Os marinheiros amotinados, com as cabe�as cobertas por uma lona, est�o alinhados para serem fuzilados. Os guardas apontam seus rifles e recebem a ordem de disparar. Um dos marinheiros grita: �Irm�os! Sabeis contra quem disparais?� Os guardas vacilam. Se d� outra vez a ordem. Sob uma certa angustia os guardas baixam suas armas. Ajudam aos marinheiros a atacar o dep�sito de armas, se unem a eles contra os oficiais, e a batalha � logo ganha.

Note-se que mesmo neste violento confronto o resultado � mais um assunto de autoconsci�ncia do que de for�a bruta: uma vez que os guardas passam para o lado dos marinheiros, a luta efetivamente se acaba. (O resto da cena de Eisenstein � uma grande luta entre um oficial malvado e um her�i revolucion�rio martirizado � � um mero melodrama.) Em contraste com a guerra, onde dois lados distintos se enfrentam conscientemente um ao outro, �a luta de classes n�o � apenas uma luta lan�ada contra um inimigo externo, a burguesia, � tamb�m a luta do proletariado contra si mesmo: contra os efeitos devastadores e degradantes do sistema capitalista sobre sua consci�ncia de classe� (Luk�cs, Historia e consci�ncia de classe). A revolu��o moderna tem a caracter�stica peculiar de que a maioria explorada ganha automaticamente no momento em que se torna coletivamente consciente do jogo que se joga. O oponente do proletariado n�o � em �ltima instancia nada mais que o produto de sua pr�pria atividade alienada, seja no aspecto econ�mico do capital, seja no aspecto pol�tico das burocracias sindicais e pol�ticas, ou na forma psicol�gica do condicionamento espetacular. Os dominadores s�o uma minoria t�o �nfima que seriam esmagados imediatamente se n�o conseguissem enganar a uma ampla propor��o da popula��o para que se identifiquem com eles, ou pelo menos considerem o sistema como leg�timo; e especialmente a ponto de provocar divis�es na popula��o

A lona na cara, que desumaniza aos amotinados e facilita o disparo dos guardas, simboliza a t�tica do dividir-para-reinar. O grito �Irm�os!� representa a contra-t�tica da confraterniza��o.

Embora a confraterniza��o refute a mentira sobre o que est� sucedendo em outras partes, seu poder reside en sua maior parte no efeito emocional do encontro humano direto, que lembra aos soldados que os insurgentes s�o pessoas n�o essencialmente diferentes deles mesmos. O estado trata naturalmente de impedir tal contato levando tropas de outras regi�es que n�o est�o familiarizadas com aquilo que ocorre, e que nem mesmo falam a mesma lingua; movimentando-as rapidamente para evitar uma contamina��o excessiva com as id�ias rebeldes. (Algumas das tropas russas enviadas para esmagar a revolu��o h�ngara de 1956 foram instru�das de que estavam na Alemanha e que as pessoas que enfrentavam nas ruas eram Nazis ressurgidos!)

Para descobrir e eliminar os elementos mais radicais, um governo �s vezes provoca deliberadamente uma situa��o que levar� a uma desculpa para a repress�o violenta. Este � um jogo perigoso, sem d�vida, porque, como no incidente do Potemkin, for�ar a quest�o pode provocar que as for�as armadas passem para o lado do povo. Do ponto de vista dos dominadores a estrat�gia �tima � brandir a amea�a apenas o suficiente, de forma que n�o necessite arriscar o momento decisivo. Isto funcionou na Pol�nia em 1980-81. Os burocratas russos sabiam que invadir a Pol�nia poderia provocar sua pr�pria queda; mas a constante amea�a de tal invas�o conseguiu intimidar os trabalhadores radicais polacos, que poderiam facilmente ter derrubado o estado, por tolerar a presen�a de for�as militares-burocr�ticas dentro de Pol�nia. Estas puderam finalmente reprimir o movimento sem ter que chamar os russos.

* * *

[Internacionalismo]

�Os que fazem meias revolu��es apenas cavam suas pr�prias tumbas�. Um movimento revolucion�rio n�o pode obter uma vitoria local e depois esperar coexistir pacificamente com o sistema at� estar pronto para intentar algo mais. Todos os poderes existentes deixar�o de lado suas diferen�as para destruir qualquer movimento popular verdadeiramente radical antes que se estenda. Se n�o podem esmag�-lo militarmente, o estrangular�o economicamente (as economias nacionais s�o agora t�o globalmente interdependentes que nenhum pa�s est� imune a tal press�o). O �nico modo de defender uma revolu��o � estend�-la, tanto qualitativamente como geograficamente. A �nica garantia contra a rea��o interna � a libera��o radical de todos os aspectos da vida. A �nica garantia contra a interven��o externa � a r�pida internacionaliza��o da luta.

A express�o mais profunda da solidariedade internacional �, portanto, fazer uma revolu��o paralela em seu pr�prio pa�s (1848, 1917-1920, 1968). Se isto n�o � poss�vel, a tarefa mais urgente � pelo menos prevenir a interven��o contra-revolucion�ria desde o pr�prio pa�s, como quando os trabalhadores ingleses pressionaram a seu governo para que n�o apoiasse aos estados escravistas durante a Guerra Civil Americana (inclusive quando isto significava maior desemprego devido � queda na exporta��o de algod�o); ou quando os trabalhadores ocidentais entraram em greve e se sublevaram contra a inten��o de seus governos de apoiar as for�as reacion�rias durante a guerra civil que sucedeu � revolu��o russa; ou quando pessoas da Europa e da Am�rica se opuseram � repress�o de seus pa�ses �s revoltas anticoloniais.

Desafortunadamente, at� mesmo estes esfor�os m�nimos necess�rios s�o bastante raros. O apoio internacional positivo � todavia mais dif�cil. Enquanto os dominadores mantiverem o controle dos pa�ses mais poderosos, a ajuda pessoal direta se complica e se limita. As armas e outras provis�es podem ser interceptadas. �s vezes at� mesmo as comunica��es chegam demasiado tarde.

Algo transcendente � o anuncio de um grupo que renuncia seu poder sobre outro ou que reclama contra outro. A revolta fascista de 1936 na Espanha, por exemplo, teve uma de suas bases principais no Marrocos espanhol. Muitas das tropas de Franco eram marroquinas e as for�as antifascistas poderiam ter explorado este fato declarando Marrocos independente, incitando deste modo uma revolta na retaguarda de Franco e dividindo suas for�as. A prov�vel amplia��o de tal revolta a outros pa�ses �rabes poderia haver desviado ao mesmo tempo as for�as de Mussolini, que apoiavam a Franco, para defender as possess�es italianas no norte da �frica. Mas os l�deres do governo da Frente Popular espanhola recha�aram esta id�ia por medo de que o est�mulo de tal anticolonialismo alarmaria a Fran�a e a Inglaterra, dos quais estavam esperando ajuda. Desnecess�rio dizer que esta ajuda nunca chegou de forma alguma.(11)

De modo similar, se antes que os seguidores de Khomeini pudessem consolidar seu poder, os iranianos insurgentes em 1979 tivessem apoiado a total autonomia dos kurdos, baluchis e azerbanes, poderia t�-los conquistado como aliados firmes das tend�ncias iranianas mais radicais e poderia ter estendido a revolu��o aos pa�ses adjacentes donde se haviam trasladado por��es daqueles povos, enquanto socavavam simultaneamente aos seguidores reacion�rios de Khomeini no Ir�.

Estimular a autonomia de outros n�o implica apoiar qualquer organiza��o ou regime que possa aproveitar-se dele. Trata-se simplesmente de deixar que os marroquinos, os kurdos, ou seja l� quem for, resolverem seus pr�prios acontecimentos. A esperan�a � que o exemplo de uma revolu��o anti-hier�rquica em um pais inspire outros a contestar suas pr�prias hierarquias.

Esta � nossa �nica esperan�a, mas n�o � inteiramente irreal. O contagio de um movimento genuinamente liberado nunca deve ser desprezado.


[NOTAS]

1. Sobre a revolu��o cultural, ver �Le point d�explosion de l�ideologie en Chine�, International Situationista # 11 y Simon Leys: The Chairman�s New Clothes.

2. �Na medida em que os chi�tas e kurdos combatiam o regime de Saddam Hussein e os partidos de oposi��o iraquiana trataram de remendar juntos um futuro democr�tico, os Estados Unidos se encontraram na inc�moda posi��o de apoiar a continua��o de uma ditadura de partido �nico no Iraque. As declara��es do governo dos Estados Unidos, inclu�da a do presidente Bush, acentuaram o desejo de ver Saddam Hussein derrotado, mas n�o um Iraque dividido por uma guerra civil. Ao mesmo tempo, os oficiais da administra��o de Bush insistiam que a democracia n�o � atualmente uma alternativa vi�vel para o Iraque. . . Isto pode explicar o fato de que at� aqui, a administra��o recha�asse reunir-se com os l�deres da oposi��o iraquiana no ex�lio. . . . �Os �rabes e os americanos tem a mesma agenda�, disse um diplomata da coaliz�o (contra Iraque). �Queremos o Iraque nos mesmos limites e que Sadam desapare�a. Mas aceitaremos Saddam em Baghdad para manter o Iraque como um estado��. (Christian Science Monitor, 20 mar�o 1991).

3. �� impressionante a mem�ria do povo em reter seu pr�prio passado revolucionario. Os eventos presentes sacudiram esta memoria. As datas que nunca aprenderam na escola, as can��es nunca cantadas abertamente, s�o recordadas em sua totalidade. . . . O ru�do, o ru�do, o ru�do todavia soa em meus ouvidos. Os gritos, os slogans, os cantos e bailes. As portas da revolu��o parecem abertas outra vez, depois de quarenta e oito anos de repress�o. Naquele dia simplesmente tudo mudou de perspectiva. Nada foi dado por Deus, tudo devia ser feito pelo homem. As pessoas podiam ver sua mis�ria e seus problemas em uma perspectiva hist�rica. . . . Passou uma semana, e j� parecem v�rios meses. Cada momento foi vivido intensamente. J� � dif�cil recordar o aspecto anterior dos peri�dicos, ou o que as pessoas diziam. Porque as revolu��es n�o acontecem sempre?� (Phil Mailer, Portugal: A revolu��o imposs�vel)

4. Um dos momentos mais intensos foi quando os grevistas em volta da delegacia de pol�cia evitaram um confronto potencialmente violento com uma turba hostil de estudantes conservadores que tentavam interromper a assembl�ia permanecendo completamente em silencio durante meia hora. Sem receber vento para suas velas, os provocadores se aborreceram, se desconcentraram, e finalmente se dispersaram. Tal silencio coletivo tem a vantagem de dissolver rea��es compulsivas de ambos os lados; j� que n�o ha nada impl�cito nele, como o duvidoso conte�do de muitos slogans e can��es. (Cantar �We Shall Overcome� [�Venceremos�: can��o popular do movimento pelos direitos civis] tem servido tamb�m para acalmar pessoas em situa��es dif�ceis, mas com o pre�o de sentimentalizar a realidade).

A melhor recorda��o do FSM � O Movimento da Livre Express�o de David Lance Goines (Ten Speed Press, 1993).

5. Sobre maio de 1968 ver Ren� Vi�net: Enrages e situacionistas no movimento das ocupa��es e �O come�o de uma nova �poca�, em I.S. # 12. Tamb�m se recomenda Roger Gr�goire e Fredy Perlman: Worker-Student Action Committees, France May �68 (Black & Red, 1969).

6. �A classe trabalhadora n�o apenas FECHAR� as industrias, como tamb�m as REABRIR�, para gerir apropriadamente as atividades necessarias para preservar a sa�de e a paz p�blica. Se a greve continuar, a classe trabalhadora pode sentir-se inclinada a evitar o sofrimento p�blico reabrindo mais e mais atividades SOB SUA PR�PRIA DIRE��O. E � por isso que dizemos que estamos em uma estrada que conduz � NINGU�M SABE AONDE!� (Anuncio na v�spera da greve geral de Seattle de 1919). Ver Jeremy Brecher: Strike! (South End, 1972), pp. 101-114. Lembran�as mais extensivas se incluem em Root & Branch: The Rise of the Workers� Movements e em Revolution in Seattle, de Harvey O�Connor.

7. Raoul Vaneigem (que escreveu incidentalmente uma breve e boa historia cr�tica sobre surrealismo) representou a express�o mais clara de ambos aspectos. Seu livreto De la gr�ve sauvage � l�autogestion g�n�ralis�e (�Da greve de ocupa��o � autogest�o generalizada�), recapitula proveitosamente uma s�rie de t�ticas b�sicas durante as greves de ocupa��o e outras situa��es radicais assim como v�rias possibilidades de organiza��o social p�s-revolucion�ria. Desafortunadamente est� tamb�m adornado com a inflada verborr�ia caracter�stica dos escritos p�s-SI de Vaneigem, atribuindo �s lutas oper�rias um conte�do vaneigemista desnecess�rio e injustificado. O aspecto da subjetividade radical se coagulou em uma ideologia hedonista tediosamente repetida nos �ltimos livros de Vaneigem (O livro dos plazeres, etc.), lidos como c�ndidas par�dias das id�ias tratadas t�o incisivamente em seus trabalhos anteriores.

8. �Estamos no segundo dia [de greve], estou cansada, mas levando em conta as sensa��es positivas que ocorrem neste lugar, a fadiga n�o prevalece. . . . . Quem esquecer� a cara dos diretores quando lhes dissemos que o controle agora era nosso, e que seus servi�os j� n�o eram obviamente necess�rios. . . . Tudo continua normal, exceto que n�o faturamos as chamadas. . . . Estamos tamb�m fazendo amigos nos outros departamentos. Os rapazes do andar de baixo nos ajudam e est�o aprendendo nosso trabalho. . . . Estamos voando. . . . Nadando em adrenalina pura. � como se possu�ssemos toda a maldita empresa.  . . O aviso na porta diz, CO-OP TEL: SOB NOVA DIRE��O � PROIBIDO DIRETORES�. (Rosa Collette, �Operators Dial Direct Action,� Open Road,Vancouver, Spring 1981.)

9. �Uma companhia sulafricana est� vendendo um ve�culo antidisturbios que emite m�sica pelos alto-falantes para acalmar os nervos dos indiv�duos potencialmente problem�ticos. O ve�culo, j� adquirido por uma na��o negra, que a companhia n�o identifica, carrega tamb�m um canh�o de �gua e um lan�ador de g�s�. (AP, 23 setembro, 1979.)

10. �Na tarde de 10 de novembro, quando o Comando Supremo estava em um Spa, um grupo de sete homens se apresentou no quartel. Era o �Comit� Executivo� do Conselho Supremo de Soldados do Quartel General. Suas demandas eram algo confusas, mas obviamente esperavam jogar um papel no comando da Armada durante seu retiro. Eles queriam ao menos o direito de referendar as ordens do Comando Supremo e assegurar que o ex�rcito n�o fosse utilizado para nenhum prop�sito contra-revolucionario. Os sete soldados foram cortesmente recebidos pelo lugar-tenente coronel Wilhelm von Faupel, que havia ensaiado cuidadosamente para a ocasi�o. .. . . Faupel deixou os delegados na setor de mapas do Comando Supremo. Tudo foi demarcado em um mapa gigantesco que ocupava toda uma parede: um enorme complexo de estradas, estradas de ferro, pontes, comutadores, tubos, postos de comando e dep�sitos de provis�es � todo um intrincado encaixe de linhas vermelhas, verdes, azuis e negras que convergiam em um estreito gargalo de garrafa nas pontes cruciais do Rhin. .. . . Faupel ent�o voltou com eles. O Comando Supremo n�o tinha obje��o aos conselhos de soldados, disse, mas fez que seus ouvintes se sentissem competentes para dirigir a evacua��o geral do ex�rcito alem�o ao longo destas linhas de comunica��o? . . . Os soldados desconcertados olhavam inquietos o imenso mapa. Um deles concordou que isso n�o era o que eles haviam pensado realmente � �Este trabalho bem que poderia ser deixado a cargo dos funcion�rios p�blicos�. Ao final, os sete soldados deram de boa vontade seu apoio aos oficiais. Mais que isso, praticamente suplicaram para que os funcion�rios p�blicos ficassem com os comandos. . . . Sempre que uma delega��o do conselho de soldados aparecia no Quartel Supremo, o coronel Faupel voltava a repetir sua velha performance; sempre funcionou.� (Richard Watt, The Kings Depart: Versailles and the German Revolution.)

11. Se esta quest�o chegasse ao conhecimento dos trabalhadores espanh�is (que j� havia prescindido do vacilante governo da Frente Popular colhendo as armas e resistindo ao golpe fascista por si mesmos, no processo que desencadeou a revolu��o) eles provavelmente concordariam em conceder a independ�ncia a Marrocos. Em vez disso acabaram dominados pelos l�deres pol�ticos � inclusive muitos l�deres anarquistas � ao tolerar este governo em nome da unidade antifascista, n�o puderam tomar consci�ncia de tais temas.

A revolu��o espanhola continua sendo a experi�ncia revolucionaria mais rica da historia, embora complicada e obscurecida pela guerra civil simult�nea contra Franco e pelas agudas contradi��es dentro do campo antifascista, que � junto a dois ou tr�s milh�es de anarquistas e anarcosindicalistas e um contingente consideravelmente mais pequeno de marxistas revolucion�rios (o POUM) � republicanos burgueses, autonomistas �tnicos, socialistas e estalinistas, com os �ltimos em particular fazendo tudo o que estava a seu alcance para reprimir a revolu��o. As historias mais compreensivas desse tema s�o Revolution and the War in Spain de Pierre Brou� e Emile T�mime e The Spanish Revolution de Burnett Bolloten (este �ltimo foi substancialmente incorporado no monumental trabalho final de Bolloten, The Spanish Civil War). Alguns bons relatos de primeira m�o est�o em Homage to Catalonia, de George Orwell [vers�o em portugu�s: Lutando na Espanha], The Spanish Cockpit, de Franz Borkenau y Red Spanish Notebookde Mary Low y Juan Bre�. Outros livros dignos de serem lidos s�o Lessons of the Spanish Revolution, de Vernon Richards, To Remember Spain, de Murray Bookchin, The Spanish Labyrinth, de Gerald Brenan, Sam Dolgoff: The Anarchist Collectives,Abel Paz: Durruti: The People Armed, y Victor Alba y Stephen Schwartz�s Spanish Marxism versus Soviet Communism: A History of the P.O.U.M.


Fim do cap�tulo 3 de �A Alegria da Revolu��o� de Ken Knabb, tradu��o de Railton Sousa Guedes. Vers�o original: The Joy of Revolution.

No copyright.

 

Cap�tulo 1: Coisas da vida
Utopia ou quebra. "Comunismo" estalinista e "socialismo" reformista s�o simples variantes do capitalismo. Democracia representativa versus democracia delegativa. Irracionalidades do capitalismo. Revoltas modernas exemplares. Algumas obje��es comuns. O crescente dom�nio do espet�culo.

Cap�tulo 2: Excita��o preliminar
Descobertas pessoais. Interven��es cr�ticas. Teoria versus ideologia. Evitar falsas op��es e elucidar as verdadeiras. O estilo insurrecional. Cine radical. Opress�o versus jogo. O esc�ndalo de Estrasburgo. A mis�ria da pol�tica eleitoral. Reformas e institui��es alternativas. Corre��o pol�tica, ou igualdade na aliena��o. Inconvenientes do moralismo e o extremismo simplista. Vantagens da aud�cia. Vantagens e limites da n�o viol�ncia.

Cap�tulo 3: Momentos decisivos
Causas das diferen�as sociais. Convuls�es de p�s-guerra. Efervesc�ncia de situa��es radicais. Autoorganiza��o popular. O FSM. Os situacionistas en maio de 1968. O obrerismo est� obsoleto, mas a posi��o dos trabalhadores continua sendo o ponto central. Greves selvagens e ocupa��es. Greves de consumo. O que podia ter acontecido em maio de 1968. M�todos de confus�o e coopta��o. O terrorismo refor�a o estado. O momento decisivo. Internacionalismo.

Cap�tulo 4: Renascimento
Os ut�picos n�o prev�em a diversidade p�s-revolucion�ria. Descentraliza��o e coordena��o. Salvaguardas contra os abusos. Consenso, dominio da maioria e hierarquias inevit�veis. Eliminar as ra�zes da guerra e do crime. Aboli��o do dinheiro. Absurdo da maior parte do trabalho presente. Transformar o trabalho em jogo. Obje��es tecnof�bicas. Temas ecol�gicos. O florescimento de comunidades livres. Problemas mais interessantes.


[Outros textos em Portugu�s]

 

  


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